A diferença entre trabalhar com referência e pintar ao ar livre (plein air) nem sempre é evidente à primeira vista. Ambas as abordagens exigem um olhar treinado e sensível, capaz de perceber nuances que vão muito além da simples reprodução de formas. É preciso enxergar, com profundidade, os elementos que compõem a imagem, as cores, as sombras e, especialmente nas abordagens mais acadêmicas, a luz que permeia e transforma toda a cena.
Tanto a referência impressa quanto a observação direta da natureza exigem o mesmo compromisso com a finalização do trabalho. Em ambas, o objetivo é alcançar um resultado expressivo, coerente e, acima de tudo, verdadeiro com aquilo que se busca transmitir. A diferença reside na experiência do processo: pintar ao ar livre nos coloca em contato direto com as variações da luz, o movimento do ambiente e a imprevisibilidade da natureza. Já trabalhar com uma referência fixa nos oferece tempo para estudar detalhes com mais calma, permitindo outras descobertas.
A observação é um exercício essencial para qualquer pessoa que deseje se aprofundar na arte da pintura. Independentemente da técnica escolhida – óleo, aquarela, acrílica ou qualquer outra – é através da observação atenta que desenvolvemos nossa sensibilidade visual. Mais do que copiar o que está diante de nós, é preciso interpretar, sentir e transformar o que vemos em uma linguagem pessoal. O estilo e a abordagem de cada artista surgem justamente dessa prática constante, dessa convivência íntima com a imagem observada.
Um exercício interessante é cerrar os olhos parcialmente ao observar uma cena. Isso nos ajuda a desfocar detalhes supérfluos e perceber relações de cor, temperatura e contraste que muitas vezes passam despercebidas. Paradoxalmente, enxergar “menos” pode nos permitir ver mais. Essa filtragem visual nos ajuda a identificar valores tonais, volumes e atmosferas que não são evidentes em uma observação superficial.
Dentro das sombras, por exemplo, há uma complexidade que desafia a representação. Se olharmos com atenção, descobrimos espectros sutis de cor e uma variação de valores que nem sempre podem ser traduzidos com fidelidade na tela. Representar fielmente essas sutilezas pode até causar estranhamento no espectador desacostumado com essa riqueza visual. Ainda assim, é nesse espaço de ambiguidade que reside a poesia da pintura.

Ao observar objetos reais ou paisagens ao vivo, notamos como a cor é um fenômeno vivo, dinâmico. Ela muda conforme a luz incide, conforme o dia avança, conforme a nossa própria posição no espaço. Uma folha pode parecer esverdeada sob a luz da manhã, mas adquirir tons dourados ou azulados ao entardecer. A distância, a umidade do ar, o entorno – tudo influencia na percepção da cor. Nada é fixo.
Posso dizer, com convicção, que as cores têm vida própria. Elas vibram, respiram, se movem. Estão em constante transformação. Basta parar, olhar de novo – e de novo. Cada olhar revela algo novo. E é nesse ato de observar e reaprender a ver que está o verdadeiro encanto da pintura.
A cada experiência, a cada estudo, descubro um universo novo que se abre diante de mim. O mundo das referências e da observação é vasto, cheio de nuances, surpresas e aprendizados. E quanto mais mergulho nesse processo, mais compreendo que pintar não é apenas representar o que se vê – é aprender a ver.